Tristeza, preciso
da tua asa negra,
tanto sol, tanto mel no topázio,
cada raio sorri
na planície
e é tudo luz redonda em meu redor,
é tudo abelha elétrica nas alturas.
Por isso
dá-me
a tua asa negra,
irmã tristeza:
preciso que alguma vez se apague
o zéfiro e que caia
a oblíqua trepadeira da chuva,
o pranto da terra:
quero
aquele tronco rachado no estuário,
a casa enorme às escuras
e minha mãe
procurando
parafina
e enchendo a lâmpada
até não ser mais que um suspiro a luz.
A noite não nascia.
O dia resvalava
para o seu cemitério provinciano,
e entre o pão e a sombra
recordo-me
na janela
olhando o que não era,
o que não acontecia
e uma asa negra de água adejando
sobre aquele coração que, ali a janela,
esqueci talvez para sempre.
Agora sinto falta
da escuridão.
Dá-me o teu lento sangue,
fria
chuva,
dá-me o teu voo assombrado!
Devolve ao meu peito
a chave da porta fechada,
destruída.
Por um instante só, por
uma curta vida,
rouba-me a luz e deixa-me
sentir
perdido e miserável,
tremendo entre os fiapos
do crespúsculo ,
acolhendo na alma
as mãos
trémulas
da
chuva.
Pablo Neruda
In Plenos Poderes
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