quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Toma-me - Hilda Hilst



Toma-me. 
A tua boca de linho sobre a minha boca Austera. 
Toma-me AGORA, ANTES 
Antes que a carnadura se desfaça em sangue, antes 
Da morte, amor, da minha morte, toma-me 

Crava a tua mão, respira meu sopro, deglute 
Em cadência minha escura agonia. 
Tempo do corpo este tempo. Da fome 
Do de dentro. Corpo se conhecendo, lento, 
Um sol de diamante alimentando o ventre, 
O leite da tua carne, a minha 
Fugidia. 
E sobre nós este tempo futuro urdindo 
Urdindo a grande teia. Sobre nós a vida 
A vida se derramando. Cíclica. Escorrendo. 
Te descobres vivo sob um jogo novo. 

Te ordenas. E eu delinqüescida: amor, amor, 
Antes do muro, antes da terra, devo 
Devo gritar a minha palavra, uma encantada 
Ilharga 
Na cálida textura de um rochedo. Devo gritar 
Digo para mim mesma. Mas ao teu lado me estendo 
Imensa 

De púrpura. De prata. De delicadeza. 


Hilda Hilst

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